A dor chega de repente, ela invade, arromba, amedronta, tira o ar, o fôlego, o chão.
Ela dói, mói, remói e destrói... é uma dor
incompatível com a paz.
Traições surgem sem precedentes, sem pestanejar. Sua
forma e intensidade dependem de quem, com quem e o que se traiu.
Traição não vem somente das relações amorosas. Ela pode
nascer no ambiente de trabalho, criar espaço na amizade, no meio familiar. Não importa
aonde, quando chega, ela reina!
A traição é inconfundível.
Sua dor é destrutiva e as reações são surpreendentes:
ira, choro, vingança, mágoa, descrença...
Passado o tempo, algo pode mudar, alguns buscam
perdoar, outros remoem uma dor que faz a imaginação aflorar, o estômago virar
do avesso, o sono ir embora.
Mas nada se compara à clássica traição do amor. Saber
que aquela boca, pele e corpo que você ama e cuida, aquela intimidade que era
só tua, já não é mais, agora grita exposta a outra boca, pele, a outro corpo.
Que sentimento é esse que nos faz tão donos
exatamente daquilo que jamais foi ou poderia ser nosso?
A outra pessoa NUNCA é nossa. Podemos chamar de meu
marido, minha namorada, meu/minha amante... Somente o pronome é MEU, a pessoa não.
Somos do outro e o outro é nosso até o limite de cada
vontade. E ainda que muitos resistam ao chamado ato de trair, é fato que as
mentes não têm fronteiras, os pensamentos vagam e dispersam-se no despudor de
desejos que urgem.
Se traímos nosso parceiro, somos censurados. Se a
traição for feita pela mulher, imediatamente é condenada, nem precisa de
julgamentos. A mulher que trai tem sua sentença pronta. O homem que trai, via
de regra, tem sua desculpa pronta.
Mas se resistimos ao ato, acabamos por trair nossos pensamentos,
traímos os nossos desejos e por consequência traímos a nos mesmos.
Do próximo ou de si próprios, em algum momento, somos
todos traidores.
A ótica dos julgamentos é bem distinta. Quem trai o próximo
recebe intolerância. Quem trai a si mesmo é quase canonizado por resistir
duramente aos prazeres do mundo.
Nada de apologias aqui.
Não é bom trair.
E seria impossível narrar todas as razões pelas quais os amantes se prostram.
Trair dói, machuca, maltrata quem é traído, entristece
e marca quem trai.
Traidores às vezes se arrependem, às vezes viciam.
Traídos às vezes perdoam, às vezes se vingam.
Quem nunca traiu o outro, certamente tem grande
chance de ter traído a si mesmo.
Em maiores ou menores proporções, culpados ou quase
inocentes, certos ou ligeiramente errados, somos todos traidores.
AdrIAnA rIbEIrO